Álvaro Massingue: “A CCM destaca-se como parceiro digno de referência no contexto da influência dos principais investidores globais”

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Confira a entrevista exclusiva com o Presidente da Câmara de Comércio de Moçambique, Álvaro Massingue, sobre as oportunidades de negócios em Moçambique e o papel da Câmara na promoção do comércio internacional, através do incentivo a cada vez mais exportações de produtos nacionais.

Profile Mozambique: O que é Câmara de Comércio de Moçambique e onde assenta a sua relevância?

Álvaro Massingue: A Câmara de Comércio de Moçambique, abreviadamente CCM, é uma entidade criada a 17 de Julho de 1980, como uma associação de empresas, dotada de autonomia administrativa, financeira e patrimonial, sem fins lucrativos, nem políticos. Actualmente conta com mais de mil associados, que são os diversos actores do sector produtivo nacional, isto é, empresas que, de livre vontade, se filiam para desenvolverem acções associativas que sirvam para o fortalecimento mútuo, prossecução de objectivos comuns de desenvolver a economia do país e advogarem conjuntamente por políticas e acções que facilitem o ambiente de negócios e a atracção e segurança dos investimentos.

O objectivo principal da Câmara de Comércio de Moçambique, para além de desenvolver o associativismo empresarial em Moçambique, é a promoção do comércio internacional, através do incentivo a cada vez mais exportações de produtos nacionais e, igualmente, atrair investidores no quadro das prioridades da política económica visando o contínuo e rápido desenvolvimento do país e no estrangeiro. Outro papel perseguido pela CCM tem sido advogar por um ambiente favorável para o desenvolvimento da actividade empresarial e a prestação de apoio técnico e jurídico aos interesses dos seus membros, particularmente nas operações de comércio externo que estes realizem e em outras matérias para o desenvolvimento das capacidades institucionais dos seus associados.

PM: De forma retrospectiva e tendo em consideração o último ano, quais foram os desafios mais evidentes com os quais a instituição se deparou e quais as medidas adoptadas para os ultrapassar?

AM: Em primeiro lugar, há que esclarecer que os nossos desafios, como entidade associativa, são permanentes, em termos de cumprirmos com as nossas atribuições estatutárias e respondermos cabal e continuamente aos processos de consolidação das exportações, identificação de novos e potenciais mercados para a produção nacional, atração de investimentos e promoção da imagem do país na arena económica internacional e, de forma permanente, promovermos acções de capacitação dos produtores nacionais em matérias de melhoria da qualidade dos seus produtos, certificação, embalagem e rotulagem, de forma a se apresentarem mais competitivos no contexto de um mercado dinâmico a nível nacional e internacional.

Outro desafio, também permanente, é a promoção contínua de uma imagem do que a Câmara de Comércio de Moçambique é e deve ser. Devemos evitar, promovendo uma identidade própria que não permita que sejamos confundidos com outras entidades associativas empresariais. Portanto, refiro-me à promoção de uma liderança no contexto dos objectivos do fortalecimento dos produtores nacionais, promoção e divulgação da nossa produção além-fronteiras e na certificação da originalidade dos nossos produtos.

Isto inclui, também, um cada vez maior dinamismo na nossa missão de proteger, no país e no estrangeiro, a propriedade industrial das empresas e organismos nacionais de carácter comercial, agrícola, técnico-científico e económico, e servir de agente para intermediar o registo dos direitos da propriedade industrial na entidade competente.

Em segundo lugar, tem sido um desafio a promoção de uma Câmara que não seja vista como concorrente ou adversária de qualquer instituição no país e nisto temos sido felizes, como prova o reconhecimento do nosso papel distinto pelo próprio Governo de Moçambique, o que nos confere maior legitimidade no exercício das nossas competências institucionais. E isto decorre, fundamentalmente, do facto de que a nossa génese, objectivos e princípios não são e nem devem ser confundidos com as de qualquer outra agremiação, apesar de, no curso da nossa actuação, ser indispensável a complementaridade das nossas acções com as das outras agremiações empresariais, na caminhada para o objectivo comum de advogar pela remoção das barreiras aos investimentos e ao desenvolvimento das actividades das empresas.

A nível institucional os nossos principais desafios são a sustentabilidade financeira e a prestação de cada vez melhores serviços aos membros. No campo da sustentabilidade, referimo-nos, também, à criação de capacidades institucionais, em termos de recursos humanos qualificados e capazes de responder aos desafios de bem servir. E este é um processo contínuo que inclui a reorientação e programas de capacitação dos recursos humanos existentes, bem como a contratação de pessoal com outras capacidades para colaborar nesta finalidade.

Temos, também, o desafio de aprimorarmos o papel da Câmara na advocacia pela remoção das diversas barreiras aos investimentos e contribuir para a melhoria das políticas públicas que têm impacto na vida empresarial. Neste âmbito, 2023 foi fecundo em contactos com instituições governamentais, a nível central e local, visando uma interação sobre melhores formas de colaboração na identificação destas barreiras e encaminhamento de propostas de solução. Permanece, contudo, o desafio de potencializar o nosso papel junto da Assembleia da República, como mais alto órgão legislativo do país, particularmente através da sensibilização e actualização permanente dos deputados sobre os principais constrangimentos da vida empresarial, que é para influenciarmos a sua capacidade de iniciativa de lei em benefício dos agentes económicos e de um ambiente mais favorável para o desenvolvimento empresarial.

A capacitação dos nossos associados em matérias de boa gestão e boa governação das suas empresas, pesquisa e identificação de potenciais mercados; certificação e melhoria da qualidade dos produtos nacionais, como já referido, figuram entre os principais desafios para relançar Moçambique na arena do comércio internacional, promovendo a competitividade dos nossos produtos e marcas nacionais, tendo também em vista os enormes desafios que a caminhada para a Zona de Comércio Livre Continental irão colocar às empresas nacionais.

Finalmente, e transversal a toda a nossa acção, temos o desafio de promover uma Câmara que preste serviços que cativem as empresas a se identificar com ela, quer pelos benefícios que terão da sua filiação, quer pelas respostas que irão encontrar para o desenvolvimento dos seus negócios. E este é o desafio de bem-servir e de alargar os nossos serviços para benefício de todos os filiados e classe empresarial no seu todo.

PM: Falemos dos principais acontecimentos que marcaram positivamente, a CCM e que contribuíram para o seu crescimento durante o ano 2023.

AM: A nossa filiação à CIT (Câmara Internacional da Indústria dos Transportes), em Junho de 2022, foi um marco importante que contribuiu para o nosso crescimento e maior notoriedade internacional. importa destacar que, em menos de um ano desta nossa filiação a esta grande entidade associativa internacional, logramos alcançar uma posição de considerável influência, o que nos permitiu granjear confiança a ponto de acolhermos a Assembleia-geral extraordinária deste organismo e diversos outros eventos que marcam o ano económico de Moçambique, quer através de uma maior presença no panorama dos maiores eventos internacionais, como em termos da promoção da atractividade económica do país como destino preferencial de investimentos. É claro que, regra geral, a materialização das intenções de investimentos tem levado o seu tempo, mas não restam dúvidas que Moçambique, através da CIT, passou a integrar um grupo de países privilegiado para os investimentos, e os resultados irão ser tangíveis, a breve trecho.

Outros eventos dignos de registo foram o sucesso da nossa participação em diversos fóruns internacionais de investimento e promoção de potencial colaboração com parceiros de diferentes quadrantes do mundo, nos quais a CCM apareceu como entidade de destaque na representação das potencialidades do país e como parceiro digno de referência no contexto da influência dos principais investidores globais. Posso aqui referir-me a fóruns como o Invest in Africarealizado em Amsterdão, Fórum Internacional de Riade, na Arábia Sauditafóruns de negócios dos Emiratos Árabes Unidos, da TailândiaFOCAC, o Fórum de Franchising dos EUA, entre diversos outros a nível do Continente Africano e que se constituíram em ricas oportunidades de afirmação do papel da CCM no seu contributo aos esforços de desenvolvimento de Moçambique.   

PM: Qual é o “apetite” dos investidores e das empresas estrangeiras pelo mercado moçambicano? Por favor, dê exemplos concretos de investimentos/transações comerciais existosas.

AM: Conforme afirmei em respostas anteriores, a materialização das intenções de investimentos leva o seu tempo, e isto se deve aos processos longos e complexos entre a manifestação da intenção de investimento e a tomada da decisão final de investimento. Aliás, mesmo após a tomada da decisão final de investimento, o caminho continua longo, considerando a necessidade de mobilização de recursos necessários, identificação de potenciais parceiros, etc. Entretanto, este longo processo nunca significa falta de “apetite” ou interesse de investir. E nós estamos satisfeitos e esperançosos dos resultados das diversas missões de prospecção do potencial nacional que têm sido realizadas por diversos parceiros e investidores, incluindo as manifestações de interesse resultantes de diversas missões empresariais e fóruns de negócios.

Relativamente a transacções comerciais, é digno de referência o crescimento das nossas exportações de cereais e amêndoas para diversos mercados, particularmente feijões, castanha de cajú, macadâmia, entre outros; o recente acordo de exportação de água mineral de uma marca nacional para o mercado asiático; a exportação da nossa banana, para além do tradicional mercado de mariscos que está conhecendo maior expansão.

Em suma, o potencial de investimentos em Moçambique, apesar de não poder ser devidamente mensurável, é enorme e encorajador, do mesmo modo que é bastante crescente e fértil o mercado de exportações os nossos produtos para diversos mercados mundiais.

PM: O que fazer para incrementar os investimentos e as transações? E quais os sectores em que há mais interesse e porquê?

AM: Todos os actores da nossa economia já estão engajados neste processo. Conforme disse, não se trata de estar algo em falta para atrair investimentos. o Governo e diversas entidades públicas, as diversas entidades associativas, incluindo a própria CCM e as empresas em particular estão devidamente engajadas neste processo. O que o país precisa é a paciência necessária de continuar a divulgar do seu potencial e aprimorar a sua advocacia de modo a influenciar uma rápida materialização das diversas intenções de investimento, quer através de uma rápida acção dos potenciais na tomada de decisões finais de investimento, quer nos processos de desembolso dos recursos financeiros necessários.

A nível interno, e este trabalho está igualmente em curso, devemos continuar a aprimorar a legislação sobre o fazer negócios em Moçambique, criarmos um ambiente mais estável e seguro para os investidores nacionais e estrangeiros, eliminando o terror que a onda de raptos e sequestros representa para os homens de negócios, incluindo os focos de instabilidade militar como os que acontecem nalgumas regiões de Cabo Delgado. Com uma legislação aprimorada e que tenha em conta todas as barreiras para o desenvolvimento de negócios, incluindo aspectos de segurança, Moçambique tem tudo para se transformar no principal destino de investimentos da Região e, quiçá, do continente.

PM: Investimentos: Quais devem ser os pontos de atenção que os investidores devem ter para o presente ano?

AM: Na óptica da CCM o agronegócio e a industrialização devem ser os principais focos, quer pelo potencial existente, quer, também, pela capacidade de respostas que estes sectores representam para os desafios do aumento da produção, da produtividade e da redução dos índices de desemprego que são a maior causa da pobreza de muitas famílias. A industrialização tem, sobretudo, o poder de permitir a transformação interna dos produtos nacionais e o potencial de aproximar as zonas de produção dos principais centros de comercialização, o que contribui para toda uma grande cadeia de valor de expansão e desenvolvimento de infra-estruturas, melhoria das condições de vida das populações, e muito mais.

PM: Como é que caracteriza o estado actual da produção nacional?

AM: Continuamos com muitos desafios, apesar de alguns avanços. Os principais desafios estão na mecanização agrícola, desenvolvimento da indústria de fertilizantes, introdução e expansão de tecnologias de produção, certificação, embalagem e rotulagem e, sobretudo, abertura de linhas de financiamento concessionais e a taxas favoráveis para o sector produtivo, incluindo a expansão de instituições financeiras de desenvolvimento vocacionadas para o desenvolvimento deste sector produtivo. O potencial é enorme, apenas falta o incremento de investimentos nestes aspectos. Como disse antes, a crescente presença de muitos produtos de origem nacional em mercados mundiais é um enorme sinal de esperança e confiança.

PM: Como é que a Câmara de Comércio está representada a nível das províncias?

AM: Para além dos nossos associados, temos delegações em todas as províncias, dirigidas por empresários de reconhecido mérito e que expandem os serviços prestados pela CCM para o seu âmbito, incluindo programas de assistência e apoio aos associados, iniciativas de capacitação, estabelecimento de parcerias e ligações empresariais, sob coordenação e assessoria do nosso escritório central.

PM: Para terminar, quais as principais metas e prioridades traçadas para a CCM, para o ano 2024?

AM: As nossas prioridades constam das linhas fundamentais do manifesto que apresentamos para as eleições em que a nossa lista saiu vitoriosa e que são a base para o Plano Estratégico 2021 – 2025. A nossa maior aposta é uma Câmara que seja líder na advocacia, informação sobre os negócios, recursos e ligações empresariais em todo o país, com capacidade de fornecer produtos, serviços e informação que serão, unicamente, disponibilizados pela Câmara da forma mais eficiente e desejada. Queremos servir e exceder à necessidade dos nossos membros, Governo, parceiros estratégicos e à comunidade, em geral, e para que possamos materializar estas prioridades, apostamos nos valores de boa governação corporativa, responsabilidade fiscal, diversidade e liderança, e proactividade.  

Queremos continuar a modernizar a actuação e a prestação de serviços aos nossos membros, e consolidar o nosso

papel de entidade credível e de referência nacional e internacional na promoção de negócios e do associativismo empresarial, e fazer da nossa Câmara um parceiro preferencial do Governo e de diversas entidades na promoção da imagem do país e na atracção de investimentos. Continuaremos a prestar o nosso contributo para a remoção das maiores barreiras que as empresas enfrentam, particularmente no comércio internacional, na sua inserção nos grandes projectos nacionais de desenvolvimento, através da promoção do conteúdo local.

Importa aqui destacar que seremos sempre orientados pelo aposta na busca de respostas aos anseios dos filiados à Câmara e da classe empresarial no seu todo, para assegurar o desenvolvimento dos seus negócios e a continuidade dos seus empreendimentos, bem como a busca de melhores soluções para que as condições de investimento nacional e estrangeiro se tornem, cada vez mais, propícias para o florescimento dos mesmos.

E para a materialização de todo este desiderato, mais do que de palavras, a nossa liderança aposta numa equipa dinâmica, responsável e competente que já está pondo mãos à obra  para assegurar que a nossa Câmara seja, verdadeiramente, abrangente, activa e ética .